Nova Andalus – Parte II: Difference between revisions
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Latest revision as of 19:01, 9 June 2011
Artigo original do Blog Textos para Reflexão
continuando da parte 1
De fato, o crescimento do islamismo é exponencial. Durante séculos, o catolicismo desfrutou o privilégio de ser a religião com o maior número de fiéis. Já não é assim. Em 2008, o monsenhor Vittorio Formenti, que trabalha na edição do relatório anual de estatísticas do Vaticano, revelou ao L’Osservatore Romano, órgão oficial da Igreja, que atualmente há 1,3 bilhão de muçulmanos no mundo e apenas 1,1 bilhão de católicos. O futuro, de todo modo, favorece os seguidores de Maomé. No ritmo atual de expansão do islamismo, em menos de vinte anos os muçulmanos serão 30% da humanidade. O número de católicos então representará 16,7% da população mundial e os cristãos serão 25%.
A despeito do desespero de certos cristãos ante tal situação [1], fato é que a taxa de natalidade fará com que os muçulmanos continuem em crescimento avançado... Mas será que isso bastará para que o pan-islamismo declare-se vitorioso na Europa?
Ora, o alto índice de fertilidade tem a ver com o papel subalterno da mulher e a valorização da família numerosa na sociedade islâmica. Mas as condições socioeconômicas influenciam tanto quanto as normas religiosas. Em mais da metade dos países com maioria muçulmana, o PIB per capita está abaixo de mil dólares anuais. Isso equivale a um quarto da renda brasileira. Países pobres, famílias maiores. Um temor crescente entre os países europeus é ter sua identidade cultural – marcadamente cristã – ameaçada pelo crescimento da população muçulmana. Na França, imigrantes islâmicos e seus descendentes representam 10% da população. Entre os jovens franceses, o porcentual de muçulmanos sobe para 30%.
Sim, ao que tudo indica Gadafi estava correto quanto ao crescimento do expoente islâmico na Europa. O que ele não contava é que isso não garantiria um Império Árabe unificado, nem na Europa nem na própria terra de Maomé, a começar pelo seu próprio país...
Amparados pelas riquezas do outro negro, o petróleo que existe em abundância (por enquanto) em diversas regiões do Oriente Médio, os ditadores, reis e califas mantiveram-se no poder, sob o discurso religioso de um Império Árabe unificado. Mas ao longo dos anos, a despeito de suas restrições a qualquer liberdade de pensamento contrário ou oposição política, esqueceram-se que um Império se faz também para seu próprio povo, e não única e exclusivamente para o benefício de algumas elites governantes.
Com o advento da internet e das redes sociais, tornou-se cada vez mais complexo para ditadores como Gadafi impedirem que as vozes contrárias e insatisfeitas se reunissem e ganhassem força juntas... Ainda mais quando os insatisfeitos, os pobres e miseráveis, se tornam a grande maioria da população jovem.
No fim, a "estratégia" dos ditadores pan-islâmicos virou-se contra eles próprios: a taxa de natalidade provocará o seu fim. O novo sempre vem, e não há Império que resista ao pensamento de um povo oprimido, quando este conquista sua liberdade – a liberdade de pensar e se comunicar.
Dessa forma, ironicamente através dos avanços da modernidade que se devem também as grandes contribuições científicas de Al-Andalus, o povo islâmico uma vez mais chegou à conclusão que sempre ocasionou a derrocada dos grandes impérios: sim, a nação é um mito, o passado é uma nação estrangeira, e o único país que existe é o país de todos nós, seres livres em busca de sua felicidade.
O ano de 2011 começou com o advento das revoltas de populações em diversos países árabes. Obviamente cada país tem o governo e a política que merece, mas é impossível não notar que este contágio de liberdade, disseminado pelas redes de internet, é tão somente a hecatombe de um processo até mesmo inevitável – não há como manter um povo longe de sua liberdade por muito tempo, e os próprios textos sagrados denotam isso muito bem. A história se repete, em um novo tempo, em um novo contexto, mas ainda assim se repete – o novo sempre vem.
Neste processo, uma imagem é tão marcante que resumirá muito bem onde o pan-islamismo estava errado [ver imagem que ilustra este artigo, acima]... Durante os protestos no Egito, que culminaram com a renúncia de seu então ditador, milhares de manifestantes se reuniram na Praça Tahir (“da libertação”), no Cairo, para um protesto na maior parte do tempo pacífico. Ainda assim, durante o Salat, um dos 5 períodos de oração diários do islamismo, pudemos ver os muçulmanos ajoelhando-se em direção a Meca e orando, enquanto o restante dos manifestantes, aparentemente não-islâmicos, permanecia de pé.
Esta imagem é marcante porque demonstra claramente que uma crença religiosa não é nem nunca foi motivo para que seres acreditassem que deveriam viver separados, ou como inimigos.
Ser islâmico é submeter-se a Allah, e talvez nesta submissão as palavras ditadas pelo anjo Gabriel devam ser seguidas acima de todas as outras. Mas em nenhum momento Gabriel afirmou que os não-islâmicos eram inimigos, ou que mereciam morrer – ainda que se recusassem a se converter ao Islã. De nada adianta tentar converter aos outros pela força, o máximo que conseguiremos, nesse caso, foi o que os últimos 2 mil anos nos demonstraram: ora conquista-se este ou aquele território, ora os perdemos novamente; ora oprimimos a liberdade deste ou daquele povo, ora todo povo readquire sua liberdade, ou é extinto; ora matamos, ora morremos, mas o novo sempre vem.
E a verdade derradeira é aquela que sempre populou as mentes dos verdadeiros profetas, dos místicos, dos poetas, dos seres amorosos, dos sábios: somos tolos por fazer guerra a nossos irmãos.
Al-Andalus foi resultado da conquista, mas não da guerra. Após as desavenças iniciais, eis que as três religiões fontes de tantos conflitos mundiais puderam conviver em harmonia por breves períodos de glorioso ecumenismo cultural, artístico, filosófico, científico, e até mesmo religioso. Queira Deus, queira Allah, que da reconquista de sua liberdade perdida, o povo muçulmano se reúna não em um novo Império Árabe, que em verdade nunca foi totalmente unido, mas em uma Nova Andalus, um novo país além de tantas nações ilusórias, um país de almas afins, que não necessitará de guerras santas para se afirmar – mas apenas da única submissão que sempre nos será a mais cara das conquistas, a submissão ao amor.