Papa Inocêncio III
Papa Inocêncio III (Anagni, Itália, 1160 ou 1161 - 16 de Julho de 1216 na Perugia [1]) foi papa de 8 de janeiro de 1198 até sua morte. Ele nasceu com o nome Lottario dei Conti di Segni, por vezes escrito apenas como Lotário de Segni.
Biografia
Vida e eleição para o papado
Lotário de Conti nasceu em Anagni, Itália.[1] O seu pai era o Conde Trasimund de Segni e era membro de uma famosa casa, Conti, do qual posteriormente provieram nove Papas, incluindo o Papa Gregório IX (1227-1241), o Papa Alexandre IV (1254-1261) e o Papa Inocêncio XIII (1721-1724). Apesar de Lotário ser comumente identificado como sobrinho do Papa Clemente III (1187-1191), na realidade isto é um erro, devido à semelhança entre o nome da família de Clemente, Scolari, com o de Scotti, a família romana da mãe de Lotário, Clarice.[2]
Lotário estudou em Roma, onde recebeu a sua formação inicial, posteriormente em Paris, estudou teologia, e em Bolonha, estudou jurisprudência. Pouco depois da morte de Alexandre III (30 de agosto de 1181), Lotario retornou a Roma e ocupou vários cargos eclesiásticos durante os curtos pontificados de Lúcio III, Urbano III, Gregório VIII e Clemente III, que o tornou Cardeal-diácono de Saint George, em Velabro, e Saints Sergius e Bacchusem em 1190, e depois Cardeal-presbítero de St. Pudentiana.[3]
Durante o pontificado de Celestino III (1191-1198), membro da Casa de Orsini e inimigo da Casa dos Segni, retirou-se para Anagni, dedicando-se a literatura. Neste período, Lotário escreveu "A miséria da condição humana" (De Miseria Humanae Conditionis).[4] O seu trabalho foi muito popular por séculos, sobrevivendo em cerca de 500 manuscritos. Ele nunca retornou ao trabalho complementar que pretendia escrever "Sobre a dignidade da natureza humana".[5] Ele subscreveu bulas papais entre 7 de dezembro de 1190 e 4 de novembro de 1197.
Celestino III morreu no dia 8 de janeiro de 1198. Antes de sua morte ele pediu ao Colégio de Cardeais para eleger Giovanni di San Paolo como seu sucessor,[3] mas Lotário de Conti foi eleito papa, em Roma, em 22 de fevereiro de 1198. Ele foi coroado e tomou o nome de Inocêncio III. Ele tinha apenas trinta e sete anos de idade na época.[1]
Reposição do poder papal
Como papa, Inocêncio III desenvolveu um sentido muito amplo de sua responsabilidade e autoridade. A recaptura de Jerusalém pelos muçulmanos em 1187, foi considerado por Inocêncio um castigo divino devido aos lapsos morais dos príncipes cristãos. Ele também determinou a proteção da liberdade da Igreja dos príncipes seculares. Essa determinação significa, entre outras coisas, que os príncipes não deviam ser envolvidos na escolha dos bispos, e foi focado principalmente nos Estados Pontifícios, localizados no centro da Itália, que era rotineiramente ameaçado pelos reis alemães da Casa de Hohenstaufen que, como os imperadores romanos, reivindicavam este território para si próprios.
Com a morte do imperador Henrique VI, posteriormente seu filho, o infante Frederico II deveria se tornar rei da Sicília, rei dos alemães, e imperador romano, uma combinação que deixou a Alemanha, Itália e Sicília sob um único governante e deixou os Estados Pontifícios extremamente vulneráveis..[1] A viúva de Henrique VI, mãe de Frederico, Constança, governou a Sicília, antes que seu filho atingisse a maioridade. Antes de sua morte, em 1198, Constança tornou Inocêncio guardião de Frederico, até que ele atingisse a maioridade, dessa forma, Inocêncio recuperou os direitos papais na Sicília, que haviam sido abolidos décadas antes por William I da Sicília sob o Papa Adriano IV (1154-1159).
Participação nas eleições imperiais e poder feudal na Europa
A participação do Papa Inocêncio III nas eleições imperiais do Sacro Império Romano Germânico foi documentada por muitas de suas cartas, dentre elas estão:
Sobre a autoridade papal: Carta ao prefeito Acérbio e os nobres da Toscana, 1198,
Assim como o Fundador do universo estabeleceu duas grandes luzes no firmamento do céu, a luz maior para governar o dia e a luz menor para governar a noite, assim também Ele estabeleceu duas grandes dignidades no firmamento da Igreja universal (…), a maior para governar o dia, isto é, as almas, e a menor para governar a noite, isto é, os corpos. Estas dignidades são a autoridade papal e o poder real. Agora, assim como a lua retira sua luz [quando surge] o sol; e é certamente menor em quantidade e qualidade, na posição e no poder, assim também o poder real deriva do esplendor da dignidade da autoridade pontifícia (…)".[6]
Outras cartas de Inocêncio III enviadas durante esta tentativa de garantir o poder papal e minimizar a autoridade dos imperadores foram escritos sob o título de "Políticas Papais":
- "Em Heresia": carta ao arcebispo de Auch, 1198;
- "Em Usura": Carta aos bispos franceses, 1198;
- "A Independência da Igreja/Dízimos": Carta a um bispo, 1198;
- "Na cruzada e no Comércio, Sarracenos": Carta aos venezianos, 1198;
- "Sobre os judeus": Decreto de 1199.[7]
Durante o pontificado de Inocêncio III, o papado estava no auge de seu poder temporal, e Inocêncio foi considerado a pessoa mais poderosa na Europa no momento.[8] Inocêncio III afirmou a autoridade espiritual absoluta do papado, respeitando sempre a autoridade temporal dos Reis. Com a morte do imperador Henrique VI da Germânia em 1197, o seu sucessor deveria ser designado por Inocêncio, que afirmou que ele não tinha intenção de usurpar os direitos dos príncipes, mas insistiu sobre os direitos da Igreja nesta matéria. Ele enfatizou especialmente que a atribuição da coroa imperial devia ser feita somente pelo papa. Declararam-se dois candidatos na eleição: Otto IV (de Brunswick, da família Welf), favorito do papa e apoiado pelo seu tio João I da Inglaterra, e Filipe da Suábia, irmão de Henrique VI apoiado por Filipe II. Em 1201 o papa decidiu ficar abertamente ao lado de Otto IV.
Em 3 de julho de 1201, o legado papal, o cardeal-bispo da Palestrina; Guido, anunciou para o povo, na catedral de Colónia, que Otto IV tinha sido aprovado pelo Papa como rei romano e havia ameaçado de excomunhão todos aqueles que se recusassem a reconhecê-lo. Inocêncio III no decreto "Venerabilem", que falou sobre as responsabilidades dos príncipes alemães, se dirigindo ao duque de Zähringen em maio de 1202. Esse decreto, que se tornou famoso, foi mais tarde incorporada no "Corpus Juris Canonici."
- Os príncipes alemães têm o direito de eleger o rei, que depois se torna imperador. Este direito foi-lhes dado pela Sé Apostólica (…);
- O direito de decidir se um rei assim eleito é digno das insígnias imperiais pertence ao papa, cuja responsabilidade é ungí-lo, consagrá-lo, e coroá-lo (…);
- Se o papa considera que o rei que foi eleito pelos príncipes é indigno das insígnias imperiais, os príncipes devem eleger um novo rei, ou, se recusarem-se, o papa irá conferir a dignidade imperial para outro rei, porque a Igreja é (…) uma patrona e defensora,
- Em caso de uma dupla eleição, o papa deve exortar os príncipes a chegar a um acordo. Se depois de um devido intervalo, eles não chegarem a um acordo, devem pedir ao Papa para arbitrar, pois ele pela sua própria vontade e pela força do seu cargo deve decidir a favor de um dos reclamantes. A decisão do papa não precisa ser baseadas na legalidade maior ou menor de uma eleição, mas sobre a qualificação dos requerentes.[1]
Inocêncio arrepender-se-ia do apoio que dera à Otto, pois ele mostraria ambições sobre os Estados Pontifícios, sendo que Inocêncio o excomungou. Inocêncio e Filipe II de França negociam com Frederico II, filho de Henrique VI e o coroa rei dos Romanos em Mainz em 1212. Apesar de excomungado, Otto tentou permanecer no poder aliando-se com a Inglaterra (ele era o sobrinho de João sem terra), Otto é derrotado na Batalha de Bouvines no que é hoje a Bélgica, em 27 de julho de 1214 e Frederico se torna indiscutivelmente o rei.
Inocêncio III desempenhou um papel importante na política da França, Suécia, Bulgária, Espanha, e especialmente na Inglaterra.[9] Inocêncio convovou a Quarta Cruzada, que foi desviada para Constantinopla. O papa excomungou os cruzados que atacaram cidades cristãs, porém Inocêncio manteve sua presença neste local, porque sentia, erroneamente, que ela traria uma reconciliação entre as Igrejas orientais e ocidentais. Inocêncio também ordenou uma cruzada contra os Albigenses, que moderou com sucesso a heresia dos cátaros na França, embora de forma violenta.[10][11]
Cruzadas e supressão de heresias
[[Ficheiro:Innozenz3.jpg|thumb|160px|right|Afresco do Papa Inocêncio III no mosteiro beneditino de Subiaco, Lazio, em torno de 1219.]]
Inocêncio III foi um vigoroso adversário das heresias, e empreendeu várias campanhas, tanto pacíficas quanto violentas contra elas. No início de seu pontificado, ele incidiu sobre os albigenses, uma seita que vinha crescendo no sul da França. Em 1199, ele condenou as traduções não autorizadas da Bíblia para o francês. Dois monges cistercienses foram enviados para ensinar aos Albigenses na França a fé e os ensinamentos católicos. Em 1208, o assassinato de Pedro de Castelnau, um representante do Papa no território dos Albigenses, alterou o foco das missões, que se tornaram violentas. Inocêncio convocou uma Cruzada à França para suprimir os Albigenses. Sob a liderança de Simão de Montfort uma campanha foi lançada. A cruzada foi interrompida em 1213 após a batalha de Muret em que Montfort foi derrotado por Raimundo de Toulouse e matou seu aliado, Pedro II de Aragão.[12]
Inocêncio também decretou a Quarta Cruzada, de 1198, destinada a recuperar a Terra Santa. O papa dirigiu seu apelo para os cavaleiros e os nobres da Europa, em vez dos reis, Inocêncio não estava tentando deliberadamente excluir os reis, mas Henrique da Alemanha tinha acabado de morrer, bem como Ricardo I de Inglaterra (1189-1199) e Filipe II de França, não estavam dispostos à iniciar uma cruzada. A chamada de Inocêncio III foi geralmente ignorada até novembro de 1199, quando uma cruzada foi finalmente organizada em Champagne. Os cruzados foram redirecionados para capturar Zara (Zadar) em 1202 para conseguir dos venezianos navios e transporte para o exército no mar. Constantinopla seria capturada pelo príncipe Aleixo IV em 1204. Inocêncio III ficou horrorizado com o ataque aos bizantinos por parte dos cruzados. Os cruzados que atacaram Zara foram excomungados automaticamente de acordo com as ameaças de Inocêncio, uma vez que antes do lançamento da Cruzada, Inocêncio insistiu que as cidades cristãs não deviam ser atacadas".[13]
Posição espiritual
Sobre o matrimônio
O Papa Inocêncio III autorizou em 1198 pela primeira vez o casamento de um Surdo dizendo: "Cum quod verbis non podes signis valet declare" ou " O que não pode falar, mas em sinais pode se manifestar".[14] Na Espanha impediu a dissolução do casamento dos reis Pedro II, de Aragão, e Afonso IX, de Leão.
Aprovação da Ordem Franciscana
[[Ficheiro:Giotto - Legend of St Francis - -06- - Dream of Innocent III.jpg|thumb|left|170px|"O Sonho do Papa Inocêncio III", por Giotto.]]
São Francisco de Assis em 1210 reuniu um grupo de seguidores e dirigiu-se a Roma para obter a autorização do Papa Inocêncio para a fundação de sua Ordem. Segundo o cronista inglês Matthew Paris, lá chegando, sujos e vestidos pobremente, foram ridicularizados pela corte de Inocêncio, que a considerava excessivamente rigorosa, no entanto mais tarde, o papa decidiu recebê-los em uma audiência formal depois que se lavassem. Francisco e seus amigos se prepararam então para esse outro encontro conseguindo o apoio de alguns prelados. Segundo os relatos antigos, nesse ínterim Inocêncio teve um sonho, onde viu a Basílica de São João de Latrão prestes a desabar, apenas sustentada por um pobre religioso, que ele interpretou como sendo Francisco[15]. Com a recomendação favorável de alguns conselheiros e com o aviso recebido em sonho, Inocêncio finalmente autorizou o estilo de vida franciscano.
Quarto Concílio de Latrão
Inocêncio III convocou o Quarto Concílio de Latrão pela bula papal "Vineam Domini Sabaoth" de 19 de abril de 1213, tendo o concílio se reunido em 15 de novembro de 1215, sendo considerado o concílio ecumênico mais importante da Idade Média.[16] Com a sua conclusão, foram emitidos setenta decretos reformatórios.
Diante das diversas heresias que contestavam doutrinas cristãs fundamentais, o concílio proclamou dogmaticamente doutrinas sobre os sacramentos, como a transubstanciação e a confissão dos pecados anualmente. Foram emitidos procedimentos para combater a corrupção clerical. O concílio também ordenou que os judeus usassem marcações especiais de identificação em suas roupas - um sinal da crescente hostilidade sentida pelos cristãos contra os judeus na região.[8]
Morte e legado
Após o IV Concílio de Latrão, na primavera de 1216, Inocêncio mudou-se para o norte da Itália, em uma tentativa de conciliar as cidades marinheiras de Pisa e Gênova, removendo a excomunhão sobre Pisa decretada pelo seu antecessor, Celestino III e fazendo um pacto com Génova, para motivá-los religiosamente e comercialmente.[17]
Inocêncio III, no entanto, morreu repentinamente em Perugia, em 16 de julho de 1216. Após sua morte seu corpo foi esquecido nu em uma saleta por alguns dias.[18] Só depois deste incidente ele foi sepultado na catedral de Perugia, onde seu corpo permaneceu até o Papa Leão XIII o transferir para Latrão, em Dezembro de 1891.
O legado mais significativo de Inocêncio III foi na definição do direito canónico, se tornando um dos maiores juristas de seu tempo.[1] Geralmente considera-se que Inocêncio III foi o primeiro papa a usar um brasão pessoal, além dos simbolismos próprios da Santa Sé. Duas de suas obras latinas ainda são amplamente lidas atualmente: De Miseria Humanae conditionis, um tratado sobre o ascetismo que Inocêncio III escreveu antes de se tornar papa, e De Sacro altaris Mysterio, que é uma descrição e uma exegese da liturgia.
Santa Lutgarda e Inocêncio III
Santa Lutgarda relatou que teve uma visão na qual, viu Inocêncio III no purgatório no mesmo dia que ele morreu, ele apareceu para Lutgarda em seu monastério em Aywieres, em Brabant. Envolvido em chamas, ele declarou para ela: "Eu sou o Papa Inocêncio". Ele continuou explicando que estava no purgatório por três falhas. Inocêncio solicitou que Lutgarda viesse em seu auxílio através de orações, dizendo: "Ai de mim! É terrível, e vai durar por séculos, se você não vier em meu auxílio. Em nome de Maria, que obteve para mim, o favor de apelar para você, ajude-me!". Naquele momento, ele desapareceu e Santa Lutgarda informou suas irmãs do que ela tinha visto.[19]
Template:Bibliografia
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