A Metáfora, por Joseph Campbell
Joseph Campbell é foda! É meu autor favorito, cuja leitura considero obrigatória para qualquer pessoa que deseje ter um mínimo de conhecimentos sérios sobre ritualística e simbologia. E, sem estas duas ferramentas, é simplesmente impossível tornar-se um ocultista sério.
Deixe-me começar, explicando a historia de meu impulso para colocar a metáfora no centro de nossa exploração da espiritualidade ocidental.
Quando o primeiro volume do meu Historical Atlas of World Mythology: The Way of Animal Powers foi publicado, os editores me enviaram numa turnê publicitária. É o pior tipo de turnê possível porque você tem de se encontrar, sem a menor vontade, com locutores de rádio e repórteres, eles próprios indispostos a ler o livro sobre o qual devem conversar com o entrevistado, para gerar visibilidade.
A primeira pergunta que me faziam era sempre:
“O que é um mito?”
É um bom começo para uma conversa inteligente.
Em uma cidade, porém, entrei numa estação de rádio para um programa de meia hora, ao vivo, em que o entrevistador era um jovem com ar de astuto e que imediatamente me alertou:
“Sou difícil, já vou lhe avisando. Sou um cético.”
A luz vermelha acendeu e ele começou, argumentativo:
“A palavra ‘mito’ significa ‘uma mentira’. Mito é uma mentira”.
Repliquei com a minha definição de mito.
“Não, mito não é uma mentira.
Uma mitologia completa é uma organização de imagens e narrativas simbólicas, metafóricas das possibilidades de experiência humana e da realização de determinada cultura em certo momento”.
“É uma mentira”, ele retrucou.
“É uma metáfora”.
“É uma mentira”.
Isso continuou por uns vinte minutos.
Quatro ou cinco minutos antes do fim do programa, percebi que o entrevistador não sabia o que era uma metáfora. Resolvi tratá-lo da mesma maneira como estava sendo tratado.
“Não”, eu disse.
“Eu lhe digo que algo é metafórico. Dê-me um exemplo de metáfora.”
Ele respondeu.
“Dê-me você um exemplo”.
Eu resisti.
“Não, agora eu estou fazendo a pergunta”.
Eu não tinha lecionado por trinta anos à toa.
“E eu quero que você me dê um exemplo de metáfora”.
O entrevistador ficou totalmente pasmo e chegou a dizer:
“Vamos chamar um professor.”
Finalmente, depois de um minuto e meio, ele se recompôs e disse:
“Vou tentar. Meu amigo John corre muito. Dizem que ele corre como um veado. Isso é uma metáfora”.
Enquanto se passavam os últimos segundos da entrevista, eu repliquei.
“Isso não é metáfora. A metáfora seria: John é um veado”.
Ele revidou: “Isso é uma mentira”.
“Não”, eu disse. “É uma metáfora”.
E o programa terminou.
O que esse incidente sugere sobre a nossa compreensão de metáfora?
Ele me fez refletir que metade da população mundial acha que as metáforas de suas tradições religiosas, por exemplo, são fatos.
E a outra metade afirma que não são fatos, de forma alguma.
O resultado é que temos indivíduos que se consideram fieis porque aceitam as metáforas como fatos, e outros se julgam ateus porque acham que as metáforas religiosas são mentiras.